Quer saber um pouco mais sobre teoria da tradução?
Teorias Linguísticas da Tradução:
Por Simone Vieira Resende
Referência: VINAY, Jean-Paul; DARBELNET, Jean. A Methodology for Translation. Trans. By Juan C. Sager e M.-J.
Hamel. In: VENUTI, Lawrence (Ed.) The Translation Studies Reader. London/New York: Routledge, 2000, p.84-93.
Resenha
No texto A METHODOLOGY FOR
TRANSLATION, uma metodologia para a tradução, Vinay e Darbelnet descrevem
sete métodos de tradução organizados em duas categorias: a tradução direta e a
tradução oblíqua. Por um lado, a tradução direta, como o próprio nome diz, se
refere a escolha do tradutor de traduzir cada elemento da língua fonte para a
língua alvo com base em um suposto paralelismos entre os idiomas. Por outro
lado, a tradução oblíqua se dá quando essa transposição não é possível, quando
há algum tipo de diferença estrutural entre a língua de partida e a língua de
chegada, que pode ser tanto sintática quanto lexical. Dentre os sete
procedimentos descritos, três são classificados como tradução direta e quatro
são tradução oblíqua.
A tradução literal, o empréstimo e o decalque são métodos classificados
como sendo tradução direta. O empréstimo
é um procedimento usado pelo tradutor quando há uma lacuna metalinguística entre
o texto de partida e o de chegada. A unidade que está sendo traduzida é
desconhecida na língua de chegada e assim ela é simplesmente reproduzida no
texto alvo com a mesma estrutura do texto de partida. O decalque é um uma classificação similar ao empréstimo, porém a
estruturas do léxico já sofre alterações ortográficas ou algum tipo de adaptação
que a deixe mais familiar para a cultura de chegada. A tradução
literal é o mesmo que a tradução palavra por palavra. O texto fonte e o
texto alvo têm o mesmo número de palavras. Mas, não é só isso, a ordem das
palavras segue a mesma formação sintática, classe gramatical e correspondentes
lexicais.
A meu ver o procedimento do empréstimo é muito próximo ao que conhecemos
como estrangeirismo, já que as unidades tradutórias são reproduzidas no texto
de chegada da mesma forma que aparecem no texto de partida, muitas vezes
representadas em itálico ou em negrito ou até entre aspas, já o decalque, ele
deixa de ser um tipo de estrangeirismo no momento em que a unidade que está
sendo traduzida já é conhecida na cultura de chegada e funciona como sendo o
que chamamos de neologismo. Algumas combinatórias se fixam de forma permanente
no léxico de chegada e podem até ganhar uma estrutura própria, mais familiar
para o leitor da cultura alvo. Uma afirmação dos autores que considero de
extrema relevância e que pode até ser usada para justificar o papel nuclear e
permanente do tradutor na sociedade atual - mesmo com o advento da tradução
automática - é o fato de que os dicionários não oferecem soluções para todos os
problemas que os tradutores enfrentam no seu dia-a-dia de trabalho, são os
tradutores que vão compreender a totalidade da mensagem e tomar a decisão de
como transportá-la para a cultura alvo. Essa afirmação me faz acreditar que
nenhuma máquina jamais foi ou será capaz de fazer isso tão bem como o cérebro
humano.
A tradução oblíqua apresenta
quatro procedimentos distintos: a transposição, a modulação, a equivalência e a
adaptação. O procedimento chamado transposição
tem como base a ação de rearranjar o texto de forma morfossintatica. Funciona
como se o procedimento fosse o da tradução literal, mas na verdade, a tradução
literal deixa de acontecer porque as palavras são reagrupas de uma forma
diferente do texto de partida. Em outras palavras, mesmo que as unidades que
estão sendo traduzidas, sejam traduzidas literalmente, caso não haja uma
igualdade estrutural, o procedimento usado é a transposição. Por exemplo,
quando traduzimos a frase He is a bad boy,
por ele é um garoto mau, ao invés de mau garoto estamos usando o procedimento
da transposição. O procedimento da transposição também se dá quando duas
palavras são transformadas em uma ou o oposto, quando uma se transforma em duas
e até mesmo quando há uma mudança na classe gramatical. Em certas situações, a
transposição chega a ser obrigatória por causa da estrutura fixa da língua de
chegada.
O procedimento da modulação
mantém a ideia da unidade tradutória de partida, mas faz mudanças semânticas no
texto de chegada. Tal como traduzir a expressão She is not tall por ela é baixa.
A equivalência é um
procedimento muito similar a modulação, porém as mudanças que ocorrem são mais
drásticas e alteram a estrutura do texto de partida de uma forma radical. A
equivalência se dá ao traduzirmos os clichés, as expressões idiomáticas, os
provérbios e os ditos populares. Os autores lembram que nesse procedimento grande
parte das equivalências são fixas e se referem a combinatórias e fraseologias
consagradas na cultura de chegada.
No caso do procedimento da
adaptação, o que acontece é o extremo, quando não há equivalência do
segmento tradutório entre os dois idiomas. Sendo assim, a adaptação é quando o
ato de traduzir cria uma equivalência parcial de sentido do texto de partida na
cultura de chegada, por que não há correspondente entre as duas culturas. Em
outras palavras, esse é um procedimento cultural de assimilação, ele é o oposto
do que acontece com a tradução literal, exatamente o contrário. Como por
exemplo, a tradução do trecho She missed
me por ela sente saudades de mim. Esse método afeta tanto a estrutura
sintática como o fluxo de ideias do trecho. Os autores consideram fácil
identificar quando o tradutor não usa o procedimento da adaptação, para eles,
essa ausência afeta todo o texto, mesmo quando o tradutor consegue criar um
texto considerado correto, ele pode não ter um tom fluente.
A meu ver, todos os métodos prescritos pelos autores são pertinentes
quando usados de forma conjunta. Utilizar apenas um ou escolher um procedimento
como melhor do que o outro não me parece uma prática adequada. Mesmo quando se
trata de ideias radicais como a tradução literal e a adaptação, procedimentos
que são complicados e quase nunca confessados como escolhas do tradutor. Quando
questionado sobre a forma como se traduz, acredito que nenhum tradutor admita
perante o cliente que o texto dele sofreu adaptações e nem que tenha sido
traduzido palavra por palavra. Acredito, porém, que para o tradutor em
formação, o conhecimento desses procedimentos seja fundamental para que o
tradutor possa justificar suas escolhas tradutórias de forma consciente. Para
mim, esse é o papel da teoria de tradução, ou seja, ajudar o tradutor e o
pesquisador a embasar e justificar suas escolhas feitas na prática tradutória
diária.
Acrescento ainda que, a meu ver, a ideia de se criar um método
prescritivo de procedimentos tradutórios pode ser muito útil para a investigação
e descrição das traduções já existentes, porém, por se tratar de uma abordagem
essencialmente linguística, acredito que ela peque ao deixar de lado
procedimentos que foram surgindo com o passar do tempo que atendem demandas das
novas gerações de textos criados, como por exemplo a questão da comunicação e
da semiótica que muitas vezes forçam o tradutor a usar procedimentos como a
transcriação de trechos de humor, legendas e até mesmo, textos de
especialidade.
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